terça-feira, setembro 11, 2007

Tudo nu

O nudismo não tem nada de mal. Claro que os homens não ficam bem nus. A coisa não é lá muito bonita. Já os gregos, na sua famosa estatuária, usavam uma proporção reduzida. Aspecto que se manteve por vários séculos, até que algures no norte um monumento ao emigrante levantou o problema, visto que, segundo os queixosos, o material não era consonante com a luso-virilidade. Imaginam o Michelangelo a fazer um David tipo gigante de Moçambique? Não, como é óbvio. Também é claro também não se pode reduzir o nudismo às mulheres, primeiro porque se eu quiser ir para a praia todo nu, ninguém tem nada com isso; depois porque aparecia logo uma dirigente qualquer das associações de igualdade do Bloco de Esquerda a protestar com a coisa; e por fim, para ir de calções às flores até meio das pernas, vou para a praia normal, para andar com aquelas tangas de fio dental e saquinho à frente, prefiro ir vestido de Pierrot. O nudismo não me incomoda nada, o pior que me acontece é ficar só queimado nas costas ou ficar roxo com água pelo umbigo, a levar porrada das ondas a tarde inteira. Há montes de sítios onde se pode apanhar sol descascado. Uma bela piscina na serra algarvia, dominadora sobre a linha de costa; um veleiro no alto mar; despirmo-nos todos a correr numa gaivota e mergulhar, para tornar a subir e vestirmo-nos à pressa; tirar a roupa toda num recanto qualquer campestre ou serrano e deitar-se na relva; acho mesmo que devia haver parques nas cidades onde a malta pudesse estar mais à vontade...
Vem isto a propósito de um filme imaginário sobre a Diane Arbus que começa com um jardineiro a cortar a relva com uma daquela máquinas fantásticas com lâminas em espiral. O dito cavalheiro está todo nu, pois trata-se de um campo de nudismo. Aqui é que a coisa me faz um bocadinho de confusão. Acorda, toma um banhinho e depois um café com leite, um croissant com geleia de morango tudo nu na varanda do quarto. Ainda assim, que mal é que tinha? Imagine-se agora que não é no quarto, vamos até à sala de pequeno-almoço. Tudo em pelota a manobrar chávenas de café quente entre as mesas e as criancinhas a correr. Lindo, mas perigoso. Depois piscina, e aí tudo normal, escaldão nas costas ou corpinho engelhado, mas tudo bem. Eis que são horas de almoço. Nos self-service dos clubes de nudismo a altura da prateleira por onde andam os tabuleiros é a mesma dos outros? Os tabuleiros são especiais? E se for com serviço à mesa, os empregados também andam nus? E os cozinheiros só têm barrete na cabeça? O que é que a ASAE diz disto?..
Almoçou bem, resolve descansar um pouco à sombra. Lá está, porque não fazê-lo sem roupa, não há problema nenhum. Que tal um partida de badmington? Todo nu, pois claro. Saltar quando é preciso, correr para o outro lado do court, subir à rede e surpreender o adversário, tudo nu. Verdadeiramente libertador. Ping-pong, talvez? Importante é que ande tudo aos saltos. Mais um mergulho na piscina, talvez até com arte para tal, uns mortais encarpados na prancha de dois metros (nu); um lanchezinho leve sentado nos bancos altos do bar da piscina sob o telhado de colmo (nu) e é hora de se preparar para jantar. Banho longo e quente, barba escanhoada, creme para depois do sol, bálsamo after-shave, colónia; fio de ouro com o escaravelho da sorte, Omega Seamaster, aliança (se for caso disso); peúgas Ralph Lauren, mocassins Callahan e mais nada. Assim, não vai ao self-service. Antes dirige-se ao restaurante mais chic do resort onde, naturalmente, está tudo nu. É por demais evidente que depois de duas caipirinhas, duas garrafas de vinho verde e um wiskhy com o café, acaba tudo a dançar nu na discoteca lá do sítio e a cuspir pentelhos das margaritas que o barman, todo nu, prepara com negligência. Reparem que acabar tudo nu a dançar numa discoteca é muito mais interessante se começar tudo vestido, mesmo que pouco...
Concluindo, não tem problema andar todo nu, adiciona até um grãozinho de sal à vida. Mas todo dia, todo nu? Fazer tudo, todo nu? É como dizia o outro, cada um sabe de si...

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