segunda-feira, abril 10, 2006

Falta de gosto fatal.

Creio que foi Poe que disse “que a certeza de que uma acção é nefasta, é muitas vezes o seu principal impulso” e chamava-lhe o “impulso da perversão” (mais uma vez sem certezas...). A frase será mais elegante, e o conceito de muito melhor construção, mas traduz bem aquilo que eu senti quando resolvi comprar um bilhete para ver o filme “Instinto fatal 2”. O filme vive à custa das memórias do anterior, desta vez com um inglês com ar de bimbo (pleonasmo) em vez de um Michael Douglas canastrão (pleonasmo). Toda a ambiência do filme é forçada, os diálogos são chochos e a puxar “à pintarola“ para além do razoável, a realização é mediocre, as cenas de sexo são foleiras, o guarda-roupa de uma lamentável falta de elegância, o filme vive pendurado na música, os supostos “momentos fortes” são patéticos (sim, incluindo a cena da nudez anunciada aos quatro ventos), tudo é papelão ou melhor, silicone. Vi o primeiro filme duas vezes, uma no cinema outra em video, vai para alguns anos, posteriormente vi alguns excertos na televisão, e devo confessar que sempre nutri um certo encantamento pela personagem, que era um bocado cliché com os seus carros rápidos e dotes de condução, um bocado cliché com a sua bissexualidade loura, um bocado cliché ser uma bem sucedida escritora de sexo e crime, mas, goste-se ou não do filme, este criou uma imagem iconográfica a que é muito difícil fugir e que a comparação ainda reforça mais a mediocridade a que assisti. Claro que quando anunciaram a sequência (ou talvez sequela) já sabia que acabava por ir vê-la, e mesmo preparado para o pior, e Deus sabe os filmes maus que eu já vi nesta vida, iria tentar simpatizar com alguma coisa, ainda que pequena, no filme. Mas não, o filme é uma grande merda. Mas mesmo grande. O desenrolar do filme é penoso, as personagens são tipificadas e sem espessura, sucedem-se os lugares comuns do tema, e termina na habitual situação dúbia que promete uma terceira tentativa, provavelmente com resultados ainda mais temíveis. Salva-se o charme discreto de Charlotte Rampling e uma ou outra imagem de Londres, mas isso não chega para fazer um filme...