terça-feira, novembro 06, 2007

Cenas rodoviárias nacionais

Quando escrevo desenrola-se a tragédia do autocarro na A-23. Pela manhã morreu uma criança vitima de um duplo atropelamento numa passadeira em Tires. Na sexta-feira passada três mulheres foram atropeladas quando passavam um semáforo que lhes estava verde. Duas morreram. Até ao fim da semana o governo, a câmara e entidades afins, vão tomar medidas duras e de grande alcance para a resolução do problema. Para o mês que vem ninguém se lembra e a festa continua. Já aqui falei deste problema. Todos os dias, repito, todos dias, percorro a pé várias ruas e avenidas de Lisboa. Ruas e avenidas importantes, muito frequentadas, a variadas e distintas horas e todos os dias, a todas as horas existem carros estacionados nas passadeiras, nos passeios em segunda ou terceira fila. Todos os dias, repito, todos os dias vejo - por vezes quase sinto - condutores passar calmamente, não só o vermelho que lhes diz respeito mas o próprio verde para peões. Todos os dias, a qualquer hora, e desafio quem quiser a fazer o exercício. Já vi um polícia estacionar um “veículo descaracterizado”, possivelmente o dele, numa passadeira, outro num lugar reservado a motas, tirando calmamente os apetrechos para ir trabalhar. Carros da polícia parados no meio do cruzamento, em cima dos passeios e até de um jardim. Diligentes patrulhadores do trânsito calmamente a multar gente mal estacionada, que não empatava ninguém, enquanto o Saldanha era um inferno de buzinas. Após um quase atropelamento de uma senhora idosa na Carlos da Maia, interpelei um agente gordo que detrás do seu bigode farfalhudo disse que cada um faz o deve fazer, enquanto pastoreava uns enfezados agentes da EMEL, numa rua secundária e sem trânsito. O objectivo não é enxovalhar a polícia, a quem tenho respeito genuíno, mas tão somente dizer que não é possível ter cidadãos respeitadores quando os exemplos são estes. Podemos ainda acrescentar as clássicas imagens dos variados ministros, secretários de estado, presidentes de câmara e companhia que se deslocam sem cinto de segurança, a velocidades excessivas com a maior desfaçatez. Já me insultaram, ignoraram e uma vez ameaçaram quando chamei a atenção para alguma asneira em progresso. Os piores insultos foram de uma mulher toda arreada num grande SUV que atirou o carro para cima da passadeira para parar três metros à frente presa no trânsito. Foi uma sorte ir com os meus filhos. E é certo que existe má sinalização, a localização de passadeiras (as que ainda têm tinta) é péssima, a irracionalidade da organização viária em algumas zonas é lamentável, existe gente que atravessa as ruas de qualquer forma, novos, velhos, com sacos ou com filhos. E tudo isto se agrava se andar de mota em Lisboa. Mas somos, e eu também sou, porque somos todos, muito rápidos a acusar os outros. É um instante enquanto passamos do selvagem que passa na passadeira a acelerar e a pedir desculpa aos peões (coisa que me deixa realmente fodido...), para o peão irado que insulta os condutores que não param e atravessa uma qualquer rua, em qualquer sítio a rebocar os filhos, as mochilas e os sacos do supermercado. É muito fácil clamar por acção, que falta; acusar as autoridades de inacção, que é muitas vezes verdade; exigir medidas, que fatalmente virão, custarão dinheiro e não resolverão nada; mas o que era mesmo bom era começar por termos atenção aos outros quando circulamos. Começar a ter atenção aos outros quando circulo...

Etiquetas:

1 Comments:

Blogger Henrique said...

Havias de viajar de bicicleta pelo nosso país para veres o que é falta de respeito. O país é muito bonito e é muito agradável pedalar pelas nossas estradas, mas só enquanto não há carros a circular pelas vias. Eu já assisti na primeira pessoa a desrespeitos para com os ciclistas que têm contornos assassinos. Mais do que questionar a falta de regras, as faltas de policiamento e afins, questionei-me pela mais básica falta de bom-senso dos condutores que por mim passavam. Será que a pressa de chegar vale mais que tudo o resto, mesmo que o respeito pela integridade física de alguém que circule (com todo o direito) por uma estrada?

Há bem pouco tempo também assisti a um episódio ridículo nas ruas de Lisboa, circulando também eu de bicicleta. Um senhor passou furioso por mim (por simplesmente estar a circular na rua, creio), fazendo uma razia e espetando uma dolorosa buzinadela nos meus ouvidos, tudo isto enquanto circulava a falar no telemóvel. Como foi apanhado num semáforo vermelho mais adiante, abordei o senhor e perguntei-lhe o porquê de tal comportamento. A sua resposta foi: você não pode circular por esta estrada sem matrícula. Eu ainda lhe perguntei se ele não se tinha dado conta que estava a falar ao telemóvel enquanto conduzia, mas não me pareceu que isso o apoquentasse muito.

terça nov. 06, 05:20:00 da manhã 2007  

Enviar um comentário

<< Home