sexta-feira, abril 21, 2006

Vale tudo?

Não percebi exactamente o que se passou ontem no parlamento, por isso admito que possa estar errado, no entanto existe um certo temor em confirmar as convicções que tenho. Um projecto de lei polémico dentro do próprio PS foi rejeitado por não existir quórum, que afinal era um erro electrónico (Já na faculdade os computadores é que tinham sempre a culpa), logo repete-se a votação, que naturalmente após andarem aos gritos pelos corredores do parlamento (dizem as más línguas…) lá foi aprovado para gáudio do politicamente correcto. A imagem do parlamento português não é das melhores, quer por culpa dos deputados, de hoje e de ontem, quer pela habitual inveja dos indígenas que acham que “aquilo é um poleiro”, mas estes episódios recentes, a somar a muitos outros anteriores, vieram atirar ainda mais lama. Mais do que as faltas, ou o aparente pouco trabalho, que muitas vezes tem explicações precisas que poucos estão dispostos a ouvir, este caso tem contornos mais graves e urge de uma cabal explicação, sob pena de ficar uma sombra de “chapelada”, numa matéria que deve ser de uma clareza cristalina, para além de se concordar ou não com a matéria em discussão. No tempo do Eng.º Guterres, quando da lei do aborto, o PS substituiu os deputados incómodos e fez aprovar o projecto de lei de novo, com as consequentes embrulhadas que se ainda hoje são visíveis. Agora parece querer tornar o caso mais rápido…

quarta-feira, abril 19, 2006

A velocidade máxima da irritação

Tudo o que me irrita só dá 160. A partir daí vou sozinho.

19 de Abril

O conhecimento e a memória sempre foram desvalorizados na sociedade portuguesa, e a ignorância caminha sempre de mãos dadas com as piores ideias. Vem isto a propósito do desafio lançado por Nuno Guerreiro na Rua da Judiaria com as melhores intenções, mas que por cá descambam sempre. Depois da exaltação bacoco-nacionalista do estado novo, e provavelmente como reacção, apareceram uns arautos dos oprimidos a descobrir crimes em todos os recantos da história portuguesa. Os descobrimentos transformam-se em encobrimentos, escravatura, fome, peste e guerra. Qualquer conhecimento mínimo de história vê isto como algo óbvio, cá e em todo lado. O que me aborrece é sempre a alfinetada ideológica para bater na globalização, na igreja, no estado ou em qualquer outro sujeito apanhado a jeito. A herança dos povos é constituída por momentos bons e maus, e a conversão forçada de mouros e judeus, o pogrom e a consequente fuga para outras paragens é um dos momentos mais negros de Lisboa, não só pela maldade óbvia, mas também por todas as consequências que teve na vida da cidade, porque afastou estas comunidades, embora tendencialmente fechadas, são muito dinâmicas. Acresce ainda que sempre que se expulsou, perseguiu, ou simplesmente se tornou claro que alguém não era bem-vindo os resultados deixaram sempre a desejar, seja por afastar trocas comerciais, seja por empobrecer o tecido social, seja por tornar a vida de todos um inferno. Facilmente se percebe que num país periférico todas estas questões assumem um relevo particularmente importante.

No dia 19 de Abril vou ao Rossio acender uma vela, não porque exija justiça, porque queira vingar alguma coisa, ou porque queira que alguém peça perdão, há quem se regozije com essas coisas, infelizmente faz parte do ressentimento e da mesquinhez portuguesa. Vou porque acho inaceitável a falta de memória dos portugueses, acho incompreensível que não exista nada que assinale o facto, algo físico, palpável, uma placa, um monumento, qualquer coisa que se veja e não esteja enterrado num qualquer livro de história, que infelizmente ninguém lê. Claro que isto vale para uma quantidade enorme de outras coisas, mais antigas, mais recentes, de esquerda, de direita, para todos os gostos, que em qualquer cidade importante na Europa se tropeça com facilidade.

segunda-feira, abril 10, 2006

Falta de gosto fatal.

Creio que foi Poe que disse “que a certeza de que uma acção é nefasta, é muitas vezes o seu principal impulso” e chamava-lhe o “impulso da perversão” (mais uma vez sem certezas...). A frase será mais elegante, e o conceito de muito melhor construção, mas traduz bem aquilo que eu senti quando resolvi comprar um bilhete para ver o filme “Instinto fatal 2”. O filme vive à custa das memórias do anterior, desta vez com um inglês com ar de bimbo (pleonasmo) em vez de um Michael Douglas canastrão (pleonasmo). Toda a ambiência do filme é forçada, os diálogos são chochos e a puxar “à pintarola“ para além do razoável, a realização é mediocre, as cenas de sexo são foleiras, o guarda-roupa de uma lamentável falta de elegância, o filme vive pendurado na música, os supostos “momentos fortes” são patéticos (sim, incluindo a cena da nudez anunciada aos quatro ventos), tudo é papelão ou melhor, silicone. Vi o primeiro filme duas vezes, uma no cinema outra em video, vai para alguns anos, posteriormente vi alguns excertos na televisão, e devo confessar que sempre nutri um certo encantamento pela personagem, que era um bocado cliché com os seus carros rápidos e dotes de condução, um bocado cliché com a sua bissexualidade loura, um bocado cliché ser uma bem sucedida escritora de sexo e crime, mas, goste-se ou não do filme, este criou uma imagem iconográfica a que é muito difícil fugir e que a comparação ainda reforça mais a mediocridade a que assisti. Claro que quando anunciaram a sequência (ou talvez sequela) já sabia que acabava por ir vê-la, e mesmo preparado para o pior, e Deus sabe os filmes maus que eu já vi nesta vida, iria tentar simpatizar com alguma coisa, ainda que pequena, no filme. Mas não, o filme é uma grande merda. Mas mesmo grande. O desenrolar do filme é penoso, as personagens são tipificadas e sem espessura, sucedem-se os lugares comuns do tema, e termina na habitual situação dúbia que promete uma terceira tentativa, provavelmente com resultados ainda mais temíveis. Salva-se o charme discreto de Charlotte Rampling e uma ou outra imagem de Londres, mas isso não chega para fazer um filme...

terça-feira, abril 04, 2006

Projectos a quinze anos...

Comer um duchese de quinze em quinze anos...

segunda-feira, abril 03, 2006

Elogio dos 30

Uma mulher de trinta anos tem atractivos irresistíveis para um jovem; nada de mais natural, de mais fortemente encadeado, de melhor preestabelecido que a afeição profunda, de que tantos exemplos nos oferece a sociedade, entre uma mulher como a marquesa e um jovem como Vandenesse.
Com efeito, uma rapariga tem demasiadas ilusões, excessiva inexperiência, e o sexo é demasiado cúmplice do seu amor, para um jovem poder sentir-se lisonjeado; enquanto que uma mulher conhece toda a extensão dos sacrifícios a fazer. Se uma é arrastada pela curiosidade, por seduções estranhas às do amor, a outra obedece a um sentimento consciente. Uma cede, a outra escolhe. Esta escolha não é imensamente lisonjeira? Armada com uma experiência quase sempre paga, por alto preço, com infelicidades, ao dar-se, a mulher experimentada parece dar mais do que ela própria, enquanto a jovem, ignorante e crédula, como não sabe nada, nada pode comparar, nada apreciar; aceita o amor e estuda-o. Uma instrui-nos, aconselha-nos, numa idade em que gostamos de ser guiados, em que a obediência é um prazer; a outra quer aprender tudo e mostra-se ingénua naquilo em que a primeira é tema. Aquela só permite um único triunfo; esta obriga a combates perpétuos. A primeira só tem lágrimas e prazeres, a segunda só voluptuosidades e remorsos. Uma jovem, para desempenhar o papel de dominadora, deve ser demasiado corrupta, e então é abandonada com horror; enquanto que uma mulher tem mil meios de conservar, ao mesmo tempo, o seu domínio e a sua dignidade. Uma, demasiado submissa, oferece a triste segurança da tranquilidade; a outra perde muito por não pedir ao amor as suas mil metamorfoses. Uma desonra-se sozinha, a outra mata uma família inteira por aquele a quem ama. Uma jovem só tem um atractivo e julga ter dito tudo quando se despe; mas a mulher tem-nos em grande número e oculta-os sob mil véus; em suma, afaga todas as vaidades, enquanto que a noviça só lisonjeia uma. Excitam, aliás, as indecisões, os pavores, o medo, as perturbações e as tempestades da mulher de trinta anos, que não se encontram nunca no amor duma rapariga. Chegada àquela idade, a mulher pede a um jovem que lhe restitua a estima que lhe sacrificou; só vive para ele, ocupa-se do seu futuro, deseja que tenha uma bela vida e torna-lha gloriosa: obedece, suplica e ordena, rebaixa-se e eleva-se, e sabe consolar em mil ocasiões, em que a jovem só sabe lamentar. Finalmente, além de todas as vantagens da sua posição, a mulher de trinta anos pode tornar-se rapariga, representar todos os papéis, ser pudica, e embelezar-se até com uma infelicidade. Entre ambas encontra-se a incomensurável diferençado previsto para o imprevisto, da força para a fraqueza. A mulher de trinta anos satisfaz a tudo; a jovem, sob pena de não o ser, não deve satisfazer a nada.


Honoré de Balzac

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